POR RÔMULO NEVES
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A disciplina Política Internacional é cobrada tanto na primeira fase, em algumas questões na prova objetiva, conhecida como Teste de Pré-Seleção (TPS); como na terceira fase, em uma prova específica discursiva sobre a disciplina. Apesar de a natureza de ambas as fases ser diferente, considero que uma boa preparação para a terceira fase, que envolve a exposição a uma quantidade considerável de informações sobre os diferentes temas, é o suficiente para realizar uma boa prova também na primeira fase.
Para a terceira fase, está claro que não adianta se concentrar em decorar detalhes, pois é mais importante organizar uma boa narrativa sobre os temas cobrados do que expor uma infinidade de detalhes sobre tal tema, o que prejudica o fluxo do seu texto. Mais importante do que um texto longo, cheio de detalhes secundários, espera-se que você produza um texto bem estruturado, que cubra as principais linhas dos temas cobrados.
Para a primeira fase, considerando que se trata de uma prova que cobre um conteúdo extenso, de várias disciplinas, tampouco adiantará se aferrar a detalhes de tantos temas diferentes. O estudo dos principais elementos de cada tema o habilitará a realizar uma boa prova, também na modalidade objetiva. Lembre-se: você absorveu muita informação durante sua preparação, mas é impossível você cobrir todo o conteúdo. Se fez, entretanto, uma preparação consciente e eficaz, provavelmente conseguirá recuperar as informações para realizar uma boa prova também na primeira fase. O mais importante é não perder a tranquilidade e confiar no seu processo de preparação (se você realmente se preparou). Sem pânico, sem insegurança.
Em relação à terceira fase, que é nosso foco principal (ainda que a preparação, como expliquei acima, tenha efeitos muito positivos também para a primeira fase), é importante saber que:
(i) É quase impossível estudar os temas de Política Internacional por meio de uma bibliografia tradicional. Os temas ainda não estão organizados em livros-texto, as narrativas ainda estão em disputa e, principalmente, vários dos assuntos que deverão aparecer nas provas estão se desenrolando neste exato momento, nas últimas semanas ou meses. Por isso, uma preparação eficiente terá, necessariamente, de passar por uma atualização frequente na imprensa sobre os diversos temas e/ou por um curso preparatório, como este que organizei;
(ii) O elemento mais importante para conseguir uma boa avaliação não é a quantidade de informações que você conseguir lembrar, mas o modo como você vai organizar o seu texto. As informações têm de estar organizadas numa narrativa ao mesmo tempo clara, rica e concisa. A riqueza do seu texto será o resultado da quantidade de informações que você tiver no seu repertório. Fique tranquilo em relação a isso: você terá, ao final de sua preparação, um bom repertório de informações para utilizar em seu texto. Já a clareza e a concisão serão o resultado da sua compreensão do tema, do modo como você se apropriou da narrativa.
Lembre-se de que a melhor forma de fixar as informações na memória é compreender a relação entre os diferentes elementos de um tema. Ao mesmo tempo, é essa relação que fará com que seu texto seja bem estruturado. Assim, tanto ou mais importante do que decorar os fatos, nomes e detalhes, é compreender a estrutura do problema, a relação entre esses elementos;
(iii) Diferentemente de outras disciplinas, o corretor sabe que não há um livro-texto no qual a narrativa sobre aquele tema esteja organizada. Assim, ainda mais do que em outras disciplinas, é ainda maior o valor relativo de uma boa estrutura de texto em relação a uma avalanche de dados. Detalhes, números, nomes e elementos secundários ajudam a ilustrar a sua narrativa, mas não são o centro da sua narrativa. Em vários dos temas da agenda, não há ainda, inclusive, uma narrativa consolidada. Vários elementos importantes para a compreensão desses temas só estarão disponíveis para os pesquisadores e acadêmicos daqui a alguns anos – quando, então, esse ponto da agenda não estará mais na prova de Política Internacional, mas na de História.
Como estudar?
Levando isso em consideração, a melhor forma de se preparar para a prova de Política Internacional é ter uma lista dos principais temas da agenda e garantir que você possa escrever um texto estruturado sobre todos e cada um deles.
Lembre-se de que as questões da prova discursiva não são questões fechadas e limitadas. Para qualquer tema que for cobrado na prova, SEMPRE caberá, na elaboração de sua resposta: levantar os antecedentes e condicionantes; explicar os principais interesses em jogo; explicar as consequências para os países envolvidos; e explicar eventuais consequências para o Brasil.
Além da lista de temas, é importante, no seu processo de estudo, compreender as relações entre os diversos eventos ligados àquele tema. Esse é um processo natural de memorização: a ação, a reação e as consequências, ou seja, a relação estabelecida entre os diversos fatores. Às vezes, se trata de uma relação de causa e consequência; às vezes de evolução histórica, às vezes de um conjunto de causas que se complementam para um determinado resultado.
Do ponto de vista prático, é importante fazer anotações organizadas sobre cada um dos temas e, montar, assim, uma espécie de de dossiê sobre cada tema. É possível organizar isso de maneira individual, fazendo uma pesquisa diária sobre cada um dos temas. O risco dessa estratégia é perder muito tempo buscando material relevante, especialmente na imprensa, e separando, dentro desse material, os pontos que são realmente relevantes para o panorama geral da questão. Lembre-se: a maior parte das informações que aparecem em uma matéria na imprensa é secundária. Muitas vezes, duas ou três páginas de texto publicado na imprensa diária têm apenas uma ideia importante para o panorama geral da questão para a qual você está montando seu dossiê. Se você conseguir ter acesso a um material já organizado sobre cada um dos temas, você economiza tempo de pesquisa e tempo de seleção do material relevante.
Depois de organizar essas anotações — caso você tenha acesso a um curso de Política Internacional, essas serão as anotações da aula —, releia seu material, a fim de compreender seu próprio raciocínio e fazer uma autoavaliação sobre a compreensão que teve dos problemas apresentados. Se você não entender suas próprias anotações, precisará rever o material e, eventualmente, rever a seleção que fez das informações. Ao reler suas anotações, o tema precisa estar claro para você.
O próximo passo é escrever um ou mais textos articulando as ideias. Essa será sua espécie de “cola”. É essa produção própria que garantirá que você absorveu aquelas informações ao seu repertório pessoal. Isso é a garantia que, além de ter compreendido o tema, você está habilitado(a) a discorrer sobre ele. Você pode corrigir seu próprio texto. Basta ler depois de um ou dois dias – quando já estará suficientemente distanciado de sua própria produção – e verificar se aquele texto segue fazendo sentido para você. Se você tiver acesso a um serviço de correção por uma terceira pessoa habilitada, melhor ainda. Às vezes, caímos na armadilha de “ler” em nossos textos, informações que não estão lá, mas que estão apenas na nossa própria cabeça.
Como fazer a prova?
Você já deve ter escutado isso diversas vezes: o primeiro passo para organizar sua resposta numa prova discursiva é fazer uma lista de todos os elementos que você consegue lembrar sobre aquele tema. Trata-se do famoso brainstorming. Muita gente tem medo de falhar nesse momento, de esquecer algo, de não ser capaz de lembrar tudo o que estudou. Mas há uma forma de superar essa ansiedade, pelo menos na prova de Política Internacional. Ao invés de ficar satisfeito com a primeira rodada de “recuperação da memória”, com as primeiras ideias — ou seja, os elementos primários e específicos que vêm à tona quando um assunto é suscitado (provalmente os temas mais óbvios – mas não menos importantes), você deve se organizar para fazer uma segunda rodada, dessa vez, anotando, por categorias, os elementos que lembrar. Para isso, é útil ter um check list dessas categorias, para ter certeza de que você está fazendo a recuperação dos elementos de maneira organizada na sua memória.
Assim, para o brainstorming, você tem de recuperar, para cada tema que aparecer na prova, além dos elementos gerais iniciais, elementos — que você sabe e lembra — nas seguintes categorias: i) condicionantes geográficos; ii) condicionantes sociais; iii) condicionantes econômicos; iv) condicionantes históricos; e v) condicionantes culturais (como etnia e religião). Claro que alguns elementos podem ser classificados em mais de uma dessas classes, mas separar os pontos centrais nessas categorias o ajudará a estimular sua memória – considerando que você estudou com base na relação entre os elementos e, por isso, está apto(a) a recuperá-los a partir da relação entre eles.
A partir desse planejamento do processo, você pode ir para a prova mais seguro e tranquilo e isso o ajudará exatamente a seguir esse processo de maneira ainda mais eficiente. Quanto mais tranquilo, mais efetivo será o seu processo de brainstorming e, muito provavelmente, mais estruturado será seu texto.
Outro ponto que o ajudará a manter a tranquilidade, além de ir para a prova com um “plano de voo”, é saber que você não precisa saber tudo sobre uma questão específica para garantir uma boa avaliação. Isso é contra-intuitivo, mas, quanto menos se cobrar por uma lista pré-fabricada, mais eficiente será o seu processo de recuperação dos elementos principais e maior será a probabilidade de você escrever um texto coerente, conciso e estruturado. Você vai se surprender com a quantidade de informação que nosso cérebro é capaz de recuperar quando está alimentado, tranquilo e treinado.
A partir do seu processo de brainstorming, você poderá planejar o texto que vai escrever. Claro que a linha de argumentação dependerá em alguma medida do formato da questão, mas, em geral, existem três formatos de narrativa que costumam cobrir as possibilidades de organização de um bom texto (todos exigem que você tenha claras as relações de causa e consequência entre os elementos que conseguiu recuperar):
i) A linha histórica. Nesse formato, você recupera os principais elementos de maneira cronológica, na qual o evento anterior contém as explicações para o evento seguinte, e assim por diante. Esse modelo de narrativa funciona melhor para eventos mais ou menos lineares, com poucos elementos combinatórios;
ii) A estrutura de causas concorrentes. Nesse formato, um pouco mais complexo do que o anterior, a relação de causa e consequência não é tão direta ou limitada, e seu texto deverá cobrir uma gama de elementos que, conjuntamente, levam a determinada consequência. É possível combinar o modelo (i) e o (ii), com uma recuperação da linha histórica de cada elemento significativo para sua resposta. Seu texto seria composto, assim, de algumas linhas históricas, que, combinadas, geram determinado resultado; e
(iii) Narrativas de viradas, oposições e movimentos contraintuitivos. Aqui, temos um modelo um pouco mais complexo do que os dois anteriores. Nesse caso, o tema é apresentado a partir de uma narrativa na qual a relação de causa e consequência é entrecortada por eventos que aceleram, atrasam ou até mesmo alteram o resultado esperado, dadas certas condicionantes. Em termos bem simplificados seria algo como “o tema apresenta os elementos, “x”, “y” e “z”, que, combinados, gerariam o resultado “a”, mas em razão da interferência dos elementos “w” e “k”, o resultado final foi “b” (ou ainda foi um “a” que ocorreu antes do tempo).
Vícios
Não é porque existem ferramentas para facilitar o seu processo de recuperação de elementos e a construção de uma narrativa que seu problema está resolvido. Você ainda precisa ter esses elementos em seu repertório (ou seja, estudar) e estar apto(a) a escrever um texto coerente (ou seja, treinar). O domínio de uma boa parcela do conteúdo e apresentação em uma forma coerente não acontecem por milagre, eles são o resultado de seu esforço e dedicação.
Além disso, é preciso evitar certos vícios que costumam gerar uma impressão negativa em qualquer texto. O primeiro deles é utilizar um dado — especialmente numérico – inexato, ainda mais quando ele é central para seu argumento. Se você não lembra o dado exato, não chute. É melhor citar uma faixa (mais de X; entre X e Y; maior do que tal país; o maior) do que utilizar um número exato equivocado. A mesma coisa vale para nomes, datas e locais. Sempre há uma forma de contornar a falta de um dado exato, se você domina a narrativa.
O segundo vício mais comum é o uso de expressões vazias em seu texto. Leitores atentos — e o corretor do seu texto será, provavelmente, um leitor atento — reconhecem quando uma frase ou expressão tem apenas a função de “encher linguiça”. Claro que se trata de um exemplo exagerado, mas o que você sente quando lê a frase “certamente, esse é um país que visitei, dentre os vários que conheci”? Provavelmente, não entenda na primeira vez em que ler, portanto, tem de reler para buscar algum sentido, mas como ele não tem nenhuma informação, perceberá que foi enganado, que a frase não faz sentido e apenas “enche linguiça”. A partir desse momento, sua abordagem com o texto será negativa. E você, definitivamente, não quer que o corretor tenha uma abordagem negativa com seu texto. Não use, portanto, expressões ou frases vazias e sem sentido no seu texto. Não encha linguiça.
É possível que você tenha pensado, ao ler o exemplo acima, que nunca escreveria algo tão sem sentido. Mas, para reforçar o ponto, lhe apresento outro exemplo, mais comum em textos de provas de política internacional, que alguns candidatos certamente escreverão em suas provas: “estamos numa época de transição”. Ora, a transição pressupõe dois momentos de estabilidade. Algo é transitório em contraposição a algo estável. Então, quando alguém escreve “transição”, espera-se que haja a descrição dos períodos “estáveis”, antes e depois dessa “transição”, para que ela realmente faça sentido e não seja apenas uma expressão vazia. Compreende? Caso você não apresente a contraposição à transição, essa frase vai apenas irritar um leitor atento.
Rômulo Neves
Diplomata e Jornalista
Rômulo Neves é diplomata de carreira, professor, cientista social e jornalista. Como professor preparatório para o CACD, organizou, em parceria com o Grupo Ubique, um curso completo de Política Internacional, voltado para a temporada de 2020, em que aborda os 32 temas mais relevantes da atualidade, segundo seus critérios. Clique aqui para ver detalhes de seu Curso de Política Internacional para o CACD. Durante sua carreira na diplomacia, em 15 anos, serviu nas embaixadas do Brasil na Venezuela, Suriname, Etiópia e, atualmente, no Paquistão. Na Secretaria de Estado das Relações Exteriores, foi chefe da Divisão da Sociedade da Informação e, posteriormente, da Divisão de Oceania. Tem 14 anos de experiência docente. Lecionou nos cursos de Sociologia na UnB; de Relações Internacionais no IESB, UDF e UniCeub e de Direito na Uniplac, além do Grupo Ubique. É formado em Ciências Sociais, pela USP, com especialização em Economia e Relações Internacionais e mestrado em Sociologia, pela mesma universidade. É mestre em Diplomacia pelo Instituto Rio Branco, premiado com o Prêmio Araújo Castro pela dissertação de Mestrado que produziu. Foi aluno do curso de doutorado em Sociologia, da UnB, não concluído em função de transferência ao exterior.
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