POR MARCÍLIO FALCÃO
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A frustração da reprovação; o (re)começo dos estudos; expectativas realistas de aprovação e metas de estudo.
Há 14 anos tenho participado da preparação de outros candidatos para o CACD. Não é com tanta alegria que revelo estar muito mais acostumado a lidar com a frustração da reprovação do que com a indescritível felicidade dos que passam, que são uma minoria. Entre os reprovados que sequer cheguei a conhecer, decerto há centenas que possuem atributos valiosíssimos para o exercício da profissão, mas que não são medidos pela provas. Eles seriam diplomatas excepcionais se tivessem a chance — possivelmente até melhores que os próprios aprovados. Infelizmente, eles esbarram na prova não porque carecem de capacidade. Se fosse o caso, o problema seria só deles. O problema passa a ser de todos nós brasileiros quando os potencialmente melhores deixam de ser selecionados porque não superam os crivos ocultos do concurso. É meu dever patriótico desmistificar esses crivos e contribuir para que todos os candidatos exerçam plenamente seu potencial durante a preparação.
O que me chama mais atenção nesse contato diário com os aspirantes à carreira (e não só os neófitos) é que poucos deles realmente sabem o que estão fazendo. Carecem de conhecimento de método e se iludem facilmente com a falácia de que os outros é que vão resolver seus problemas. Ainda moram na Terra do Nunca! Lá o tempo não passa, nem há regras. A gente voa, basta jogar um pozinho. Muitos agem como se o tempo não fosse acabar e mantêm as mesmas práticas que não deram e não darão certo. Sair da Terra do Nunca é acolher com convicção a ideia de que você é o único responsável pelo seu crescimento e se dispor a adotar as práticas adequadas e abandonar outras que têm sido danosas. A pior dessas práticas é, na minha humilde opinião, a busca pelo equilíbrio!
Equilíbrio gera conforto, o que nos impede de assumir os riscos que desafiam as probabilidades, como explorar um novo continente, saltar de paraquedas, casar-se, apostar em cavalos ou estudar para o concurso público mais difícil do país. O conforto nos protege do sofrimento mas também nos priva da adrenalina das aventuras e das alegrias das conquistas. Equilibrar é, em outras palavras, distribuir o risco.
Não se pode esperar a aprovação no CACD se o foco está disperso. Acredite: as perguntas mais frequentes que me fazem são a respeito de conciliar os estudos do CACD com o trabalho ou com o mestrado ou doutorado. São curiosamente menos frequentes aquelas sobre a conciliação com o lazer, família, namoro ou amigos, como se fossem menos importantes. Talvez sejam, porque não pagam as contas… Talvez aí esteja o problema dos candidatos que nunca passarão, por mais que tentem: querem estudar para o CACD e poder trabalhar 12 horas por dia, terminar doutorado sobre os moais da Ilha da Páscoa, acordar na hora que querem, ficar em dia com o Netflix, curtir os amigos, ter uma vida amorosa completa, ler os jornais e semanários, passar horas no Instagram, dar a atenção integral que uma família exige e ter um diazinho livre por semana, já que ninguém é de ferro. Há de haver equilíbrio, dizem!
Plenitude versus excelência
Já vi darem conselhos, pertinentes, por sinal, para que os candidatos tenham um “plano B”, uma carreira alternativa, já que passar no CACD é a exceção. E, de fato, estatisticamente, é. O custo da aprovação é mesmo altíssimo. Não vejo espaço para energia dissipada. E sim: isso significa que você será uma pessoa marcadamente unidimensional por um belo período de sua juventude, talvez nos anos em que é mais produtivo, quando poderia estar se preparando para adotar uma carreira promissora na iniciativa privada. Fora do serviço público, também, para ter sucesso, você não pode esperar ser CEO de uma grande corporação sem estar disposto a trabalhar 15 horas por dia, acordar de madrugada para analisar relatórios e abrir mão de estar em casa às 18h para jantar com sua família. Você vai trabalhar mais do que todo mundo que conhece (ou pelo menos do que todos aqueles que querem seu cargo). É isso o que fazem as pessoas que realmente criam ou realizam feitos excepcionais. Por isso, o primeiro passo para decidir se vale a pena entrar na briga do CACD é reconhecer e aceitar que há um custo para o sucesso. Esse custo inclui tempo de vida. Não há escolha certa ou errada! Nem todo mundo tem que querer sacrificar aquilo que é por aquilo que quer ser. Não há problema algum nisso! Desistir do CACD e viver bem com isso é uma atitude honrosa e admirável, que requer uma maturidade que poucos têm. Só posso falar por experiência pessoal: todo projeto ambicioso e complexo em que me envolvi não deixou de gerar uma fatura alta em absolutamente todos os outros campos de minha vida, sobretudo no familiar. Quando se está envolvido em um plano de grande complexidade, cortam-se brincadeiras, viagens, bate-papos longos e conversas com familiares distantes (e próximos).
Antes que me pergunte se estudar oito horas por dia é suficiente, adianto que conheço pelo menos cem candidatos que estão dispostos a estudar muito mais que isso, se esse for o custo da aprovação. É essa gente que te aguarda na porta da sala de prova. Por isso, é preciso ser realista em suas ambições. E ainda há que bater a sorte, presente em muitos momentos: quando cai exatamente o que você estudou, ou pelo menos não caiu tanto assim do que você sabe menos. Pensando em voz alta, se todas as provas da etapa discursiva fossem embaralhadas e recorrigidas pelos mesmos examinadores, a lista de aprovados muito provavelmente seria outra. Seu esforço será, portanto, o de estar mais preparado que a concorrência a ponto de neutralizar ao menos parte dos danos que o acaso vai lhe causar. Por outro lado, você ficará impressionado com quem você vai se tornar se procurar modificar seus métodos e melhorar suas práticas a cada dia que passa. Progredir dia a dia dentro de um sistema ou método eficiente supera o próprio cumprimento de metas em si.
Horizonte de aprovação
Há pouco a se fazer, no curto prazo (ou pelo menos no prazo em que as pessoas estão acostumadas a pensar), para superar desvantagens comparativas. Se você começou hoje e não domina os idiomas estrangeiros ou precisa trabalhar dois turnos por dia, saiba que seu tempo de preparação será maior em relação aos demais. Se não gosta de ler, se contenta em estudar seis horas por dia, não se interessa por assuntos relacionados à prova, não consegue extrair interesse das leituras que faz e envolver-se emocionalmente com os temas, só consegue aprender assistindo aulas (ou seja, não é autônomo), é inevitável que você demore mais para aprender e consequentemente passar. Por outro lado, você só vai saber se essas limitações são incontornáveis se tentar a prova. Várias vezes, se preciso, como costumam fazer os aprovados.
Não há compromisso frouxo ou espaço para ser mediano: se a aprovação já será árdua e penosa mesmo dando o melhor de si, imagine se tentar com menos! Não me furtarei de repetir mais do que vocês se cansarão em ler: o ponto mais alto de qualquer estrutura hierárquica será ocupado pelos indivíduos mais persuasivos, que se comunicam melhor. O processo de preparação e aprovação se resume a convencer a banca de que você é um dos melhores. Sua comunicação com esses examinadores se estabelece pelo texto, cujo valor está na forma como foi construída sua argumentação, na riqueza do conteúdo apresentado, na qualidade e pertinência da linguagem e do estilo empregado. Por isso, nada pode fazer mais sentido na sua preparação do que desenvolver esses atributos. Bastante óbvio, é verdade. Mas você se espantaria com o quanto as pessoas tendem a complicar as coisas! A grande questão é como fazer isso. A melhor resposta emana, como veremos, do princípio da especificidade.
A frustração da reprovação
Tristemente, o tempo ceifará anos altamente produtivos das vidas de milhares de ceacedistas que não se preparam de uma maneira específica, isto é, orientada para o objetivo concreto, considerando todas suas peculiaridades. O sentimento de falha por não entrar na carreira dos sonhos pode ter impactos devastadores na autoestima, deixando um vazio de realização profissional e pessoal que até dói. Presencio isso diariamente no contato com estudantes de vários concursos. Muito dessa frustração ganha corpo a partir de expectativas irreais, que nós próprios criamos. É o sentir na pele do efeito Dunning-Kruger, de que tratei em outro texto. Sempre achamos, em nosso ensimesmamento, que conosco vai ser diferente. Que, se a média de aprovação é de pouco mais de quatro anos, “eu consigo passar em dois, por que não?” Nunca nos perguntamos se os métodos de estudo, técnicas de retenção ou revisão de conteúdo, as leituras que fazemos, as aulas a que assistimos ou os serviços que contratamos realmente nos preparam para sermos a pessoa em que nos queremos tornar. É muito triste ver alguém desperdiçar vida (sem artigo mesmo) por falta de reflexão, conhecimento de método e orientação.
Conversei recentemente com uma pessoa frustradíssima por não ter passado no certame de 2019. Disse que vinha se dedicando exclusivamente ao CACD há um ano e meio; que parou tudo só para isso e, diante do fracasso na que foi sua primeira tentativa séria, pensou em desistir. Minha primeira reação foi me lembrar da média do tempo de aprovação, que é de quatro anos e meio de estudos. Veja só: estamos falando da média dos bem-sucedidos! Para cada candidato aprovado com apenas dois anos de dedicação, há outro que precisou de sete! Portanto, a frustração é quase sempre o fruto de expectativas descalibradas.
Expectativas e metas realistas
Por tudo isso, apresento, a seguir, o que acredito que seriam expectativas reais de quem quer passar. De maneira mais objetiva, esses tópicos poderiam ser vistos como metas genéricas ou habilidades desejáveis. Para quase todos eles, é interessante criar índices de controle e verificação. Outros merecem ser fracionados em tarefas específicas. Por isso, aproveitarei para dar sugestões de como acompanhar e controlar essas metas (ou melhor, habilidades quantificáveis). Sendo assim, o candidato verdadeiramente competitivo é aquele que já deu conta de:
Estudar as principais fontes bibliográficas para a prova. Aprender o conteúdo de cada fonte de estudos é uma meta em si. Tenha uma lista e curta o momento de riscar cada livro dela. Não adianta tentar alimentar a ilusão de que basta a mera leitura (com ou sem fichamento) do livro. Ele pode até ser cortado da lista, mas ainda haverá outros objetivos a cumprir. É possível que um livro tenha que ser relido tantas vezes quanto necessário para garantir a absorção adequada de seu conteúdo. Lembre-se, com duplo sentido, que método bate meta.
Quantificar a profundidade de seu domínio sobre todos os temas constantes do edital. Muito mais importante do que meramente marcar os temas que já estudou. Recomendo usar critérios mais objetivos: seu índice de acertos de questões relacionadas com cada tema (1ª fase) e a pontuação recebida pelos textos que escreveu (com foco na 2ª fase). Idealmente, controla-se o desempenho com uma porcentagem. Por exemplo: Processo de independência: 60%. Priorize o estudo dos temas com índice de acerto mais baixo;
Desenvolver a habilidade de discorrer de maneira interessante, bem construída e rica em conteúdo sobre qualquer assunto que lhe seja apresentado, de surpresa, improvisadamente e sob pressão de tempo. A melhor forma de desenvolver essa aptidão é escolher, aleatória e periodicamente, uma questão discursiva de uma prova anterior e respondê-la sem revisar o conteúdo antes. Depois de escrever o melhor texto possível, releia suas anotações sobre o assunto e reflita sobre o que faltou para conectar o que você achava que sabia (o que estudou e anotou) com o que conseguiu produzir. Se eu fosse adotar esse método, faria uma questão dessa natureza por quinzena. Perto da prova, uma por dia;
Ter algumas redações corrigidas nos moldes rigorosos de prova, obtendo pontuação aproximada suficiente para aprovação. Acredito que um candidato que tenha dez redações bem pontuadas por um professor reconhecidamente competente pode sentir-se seguro de que está pronto para a briga. Não seria um péssima ideia tratar esse número como metas em si e fazer um cafuné em si mesmo cada vez que sua tabela de controle for atualizada;
Acertar todas as questões objetivas de provas anteriores. Não é simplesmente estudar os pontos de dúvida daqueles itens que errou e deixou em branco, mas principalmente captar as sutilezas (que extrapolam o conteúdo da matéria) que o impediram de acertar a questão. Refaça as que errou ou deixou em branco até que tenha acertado todas as questões pelo menos uma vez. A certeza de estar pronto para a prova objetiva é uma aspiração fundamental, que pode ser perfeitamente quantificável (mais sobre isto no futuro). Não adianta ter a melhor capacidade de expressão do mundo se não consegue julgar os itens com os olhos de quem domina a pegada da banca. Por incrível que pareça, grande parte dos pontos disputados na primeira fase não depende do conhecimento do conteúdo, mas da habilidade de fazer provas objetivas e da perspicácia em perceber as cascas de banana, sabendo identificar as pistas que o examinador deixa quando confecciona as questões. Tudo que um membro da banca não quer é ter uma questão que propôs anulada via recurso. Por essa razão, ele usará a linguagem necessária para blindar o item de eventuais contestações. Nesse processo, obviamente, deixará pistas sutis sobre se o item é falso ou verdadeiro. O módulo 3 do programa de orientação gratuito do Grupo Ubique trata desse aspecto;
Escrever um texto sobre cada um dos assuntos que já caíram em provas anteriores, usando uma linguagem que se aproxima daquela que gostaria de apresentar à banca. Esse é objetivo mais específico e, portanto, mais trabalhoso. Elo será desenvolvida ao longo de anos. Cada texto será escrito, relido, revisado e até reescrito várias vezes. Cada nova visita é uma oportunidade de melhorar a linguagem empregada, a riqueza de conteúdo e a qualidade da argumentação. O edital, mesmo sendo um bom ponto de partida, não é forma perfeita de organizar seus estudos: ele não foi elaborado para isso, mas para proteger a banca examinadora de possíveis recursos. Já pensou nisso?
Dominar os idiomas estrangeiros com nível fluente de escrita. Não importa se você sabe falar fluentemente. Você não vai ser avaliado por isso. Nem ver Netflix com legenda em inglês é estudar corretamente! A melhor forma de melhorar seu vocabulário, sua expressividade e desenvolver-se no uso de construções gramaticais interessantes sempre será aplicar a especificidade. Escreva. Quando sentir necessidade de usar uma palavra que não conhece, busque-a e utilize-a em seu texto. O mesmo se aplica ao domínio da gramática. Veja a prática do resumo, por exemplo. Mesmo sem ter o menor conhecimento de qualquer um dos três idiomas estrangeiros, defendo que o exercício de se debruçar sobre um texto e tentar resumi-lo seria mais útil que estudar uma gramática fora de qualquer contexto e ter a esperança de conseguir aplicar aquilo corretamente caso fosse preciso. Se você lê um texto em inglês e não consegue resumi-lo, ainda está muito longe de ter alguma chance de passar. O mais natural é que o aprendizado vá ocorrendo naturalmente, à medida que você se depara com dificuldades e faz suas próprias inferências das regras gramaticais e de significados das palavras. As soluções que você descobre para as dúvidas que surgem durante esse percurso serão seus maiores ensinamentos. Fazer exercícios de gramática é apenas uma prática complementar na base da pirâmide da especificidade. O problema é achar natural que a teoria preceda sempre a prática. É como querer aprender a codificar um sistema apenas lendo um livro inteiro sobre programação. Não é assim que os melhores desenvolvedores trabalham. Eles aprendem a lidar com as complicações no momento em que surgem e, ao encontrar soluções, robustecem seu repertório de ferramentas para os próximos problemas que certamente virão. O aprendizado deveria ser assim, mas somos viciados em achar que precisamos de alguém para tudo, ou seja, não damos o devido valor às abordagens baseadas em tarefas, que dependem do nosso engajamento ativo.
Voltando ao que seria a fluência em um idioma: é a desenvoltura no uso da língua na modalidade e na situação em que é requerido. Além disso, para o CACD, é a segurança de escrever sobre qualquer tema sem cometer erros gramaticais, aplicando o vocabulário pertinente. Acrescentam-se ainda as habilidades de traduzir e resumir. Uma forma interessante de se desenvolver nos idiomas é fugir do português (do idioma, não do Manuel) quando escrever alguns dos textos sobre os conteúdos das matérias temáticas ou traduzi-los para inglês, espanhol ou francês. Além do mais, o estímulo cognitivo adicional de escrever e ler sobre História do Brasil em outro idioma não faria mal, não é? Acredito que uma boa métrica de controle seria colecionar umas dez redações bem pontuadas em inglês, além de uns cinco resumos e umas cinco traduções em cada idioma estrangeiro;
Vir se preparando há aproximadamente quatro anos. Este ponto é extremamente importante. Esse é o tempo aproximado de estudo entre os aprovados. Antes de se questionar se você está se comparando com a média, entenda que é o estimado entre aqueles que estão no topo — os que foram aprovados. Ter a expectativa de passar com um ou dois anos de preparação é criar uma ilusão que mais provavelmente se converterá em frustração e decepção. Claro que ocorre, mas normalmente com pessoas excepcionalmente talentosas, que são poucas! Por mais que estudar da forma mais eficiente relativize o tempo exigido, as horas de contato com os assuntos, por mais toscos que sejam os métodos aplicados, contam alguma coisa no resultado final. Um candidato em iguais condições que estuda uma hora a mais que você por dia, por quaisquer que sejam as razões, em dois anos terá 730 horas acumuladas a mais. Embora haja atividades mais produtivas que outras, raramente esse esforço adicional terá sido completamente inútil, contanto que você esteja no caminho certo. Por isso, chamo a atenção para a regularidade na manutenção das horas de estudo por dia, que é um indicador básico de seu envolvimento no projeto. Uma forma útil de avaliar seu progresso — ou pelo menos seu engajamento — é verificar, no fim do dia, se você cumpriu uma carga horária adequada à complexidade do projeto e condizente tanto com suas expectativas quanto com o horizonte normal de aprovação. O ato de riscar o dia no calendário, quando cumprida a carga mínima planejada, também é um item de verificação interessante e dá ao candidato o direito a um afago;
Ter escrito alguns textos de que se orgulha, com nível próximo ou superior àqueles que são apresentados nos guias inspirados na fauna. Eles devem ter o formato de uma resposta de prova. De preferência, tenha um professor experiente e qualificado para julgá-los. Não se contente com uma reação menos enfática que um uau! O esforço de tentar escrever um texto perfeito é totalmente diferente de simplesmente produzir algo muito bom. Eu diria que pelo menos uns cinco textos desse nível em cada matéria são suficientes para lhe dar essa sensação de orgulho. A vantagem de desenvolver (e reconhecer em si) essa habilidade é que ela transbordará positivamente para tudo que você escrever, o que não é tão péssimo assim. Também é bom, ao escrever, manter em mente que seu texto será de fato lido e que, portanto, você não pode entediar o leitor. O que, para você, torna a leitura de um texto interessante? Tente emular as características desses textos. Como disse o poeta americano Robert Frost, “No tears in the writer, no tears in the reader. No surprise in the writer, no surprise in the reader”. Se você não acha seu texto interessante, como espera que alguém mais ache?
Aproveito para abrir um parêntese um dia antes da divulgação do resultado do certame de 2019, que reforça este ponto de vista. Perceba que o primeiro colocado (provisório) geral no certame obteve a nota mais alta em apenas uma matéria. Adivinha qual foi? Por incrível que não pareça: Língua Portuguesa. Mesmo sem ter o melhor desempenho em História, PI, DIP, Economia, Geografia, o candidato que escreveu melhor sentou no topo. O primeiro lugar na prova objetiva, por sua vez, ficou apenas na 132ª colocação na fase discursiva. Escrever bem dá trabalho, mas compensa.
Criar mapas mentais ou qualquer outra forma eficiente de trabalhar a memorização para se certificar de que você vai se lembrar de tudo que escreveu, caso necessário reproduzir na prova. Esse ponto é fundamental e talvez o mais importante do texto! Por sorte, nossa memória é muito seletiva. Não é só difícil lembrar do conteúdo integral de algo que lemos, mas também de um texto que nós próprios escrevemos! Essa é a cereja do bolo: grande parte dos candidatos, depois de ler o texto sobre a especificidade e começar a criar suas próprias apostilas (ou cadernos, como gostam de dizer), se darão por satisfeitos quando as tiverem completado. Não se dão conta, entretanto, de que lhes será requerida a habilidade de conseguir reproduzir, em situação de prova, o conteúdo daquelas redações. Por esse motivo, recomendo fortemente que cada texto tenha uma versão esquemática e que ela seja tão bem memorizada a ponto de ser integralmente resgatada. Esses esquemas serão a ponte entre o melhor que você produziu ao longo de sua preparação e o que você de fato conseguiria apresentar à banca, que é o que importa, no fim das contas. A título de sugestão, crie esse diagrama paulatinamente, junto com a construção do texto, e melhore-o com o tempo, já que o conteúdo das apostilas também se refinará ao longo dos anos. Uma dica interessante é ter uma coletânea de snippets (frases feitas ou construções argumentativas interessantes) que você poderá sacar da manga (ou melhor, da memória, para não ser desclassificado) para enriquecer sua prova. Algumas dessas frases podem ser usadas indistintamente em Economia ou História, por exemplo. São como riffs de um jazzista que você reconhece em várias músicas.
Desenvolver a capacidade (não necessariamente o hábito) de escrever por mais de quatro ou cinco horas seguidas, sem sentir que sua existência está ameaçada. O ceacedista “Nutella” põe alarme para avisar quando a sessão de estudos completa 45 minutos porque ele tem que parar para descansar e evitar o estresse… Um pouco de caos faz bem! Sob qual justificativa você interromperia um momento produtivo para respeitar a arbitrariedade de uma regra que deveria ser um guia geral, mas que as pessoas tomam como se estivesse talhada em pedra? Todo mundo já viveu momentos de concentração extrema que chegaram a durar horas a fio. O pior é o seguinte: você só se dá conta de quanto os ciclos rígidos e curtos de estudos (inventados por pessoas que nem sabem que você existe) não te permitiram desenvolver uma habilidade não só útil, mas necessária durante a prova: escrever por até 5 horas seguidas, com intervalos ínfimos, que você próprio vai arbitrar! Portanto, não espere ser aprovado na primeira etapa para levar isso em conta.
Entendeu por que os aprovados demoram pelo menos quatro anos para chegar lá? Se fizer tudo isso acima e não virar diplomata, sua frustração estará justificada. Até poder dizer que está cheio, há muito arroz e feijão para comer.
A parte II deste artigo tratará sobre a hierarquia de técnicas e métodos de estudo na pirâmide da especificidade, bem como sobre o estudo de atualidades e idiomas, planejamento e organização. Também será apresentada uma seleção bibliográfica suficiente para mantê-lo ocupado por um bom período.
Marcílio Falcão
Diplomata
Marcílio Falcão (@falcao.marcilio) é diplomata de carreira há quase 12 anos e orientador para o CACD. Jornalista de formação, iniciou-se na docência há 23 anos e se dedicou, de forma intermitente, desde sua aprovação no CACD, à preparação de outros candidatos ao concurso.
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