POR HÉLIO SILVA FILHO
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A maior parte dos candidatos à carreira diplomática não estudou Economia em cursos de graduação ou antes disso (como História Geral e do Brasil e Geografia). Como candidato, entenda o que isso pode representar para o seu desempenho no concurso: se você é economista ou tem boa fluência na matéria, será um diferencial importante para sua classificação (mas não deixe de se preparar: a prova do CACD é muito particular, como tentarei explicar).
Se você não tem bons conhecimentos sobre Economia, valorize o estudo do programa do CACD, pois se trata de uma das provas com maior disparidade de notas entre os candidatos. Resumindo: seus pontos nos testes e nas questões dissertativas sobre economia terão importância relativa acima da média em comparação às demais matérias da 3ª fase do concurso (após a seleção de Inglês e Português, tradicionalmente a maior “peneira” do CACD).
Programa de Economia e suas abordagens
O programa de Economia é dividido em quatro partes principais: (i) Microeconomia (teorias sobre consumidores, firmas, produtores e bens); (ii) Macroeconomia (PIB, emprego, renda, contas externas, políticas fiscal, monetária e de crédito); (iii) Economia Internacional (pode ser vista como uma extensão de Macroeconomia: teorias de comércio, economia aberta e política comercial); e (iv) História Econômica Brasileira (do século XIX até a consolidação do Plano Real no final dos governos FHC).
Formalmente, no programa, há uma quinta parte, mais contemporânea, sobre Bancos digitais, meios de pagamento e dinheiro digital, que, de todo modo, considerarei parte de Macroeconomia, pela sua conexão com o estudo de moedas, bancos e política monetária.
Trata-se de programa bastante extenso. A boa notícia é que as questões (testes e discursivas) do CACD não costumam ter o mesmo nível de tecnicidade de uma prova para Banco Central, IPEA ou Tesouro Nacional. Raramente se exigem cálculos nas provas, por exemplo, ou gráficos e equações complexas.
Por outro lado, a particularidade do CACD é exigir, na etapa discursiva, reflexões que muitas vezes deixarão mestres e doutores em Economia sem saber o que escrever… Falo por mim mesmo: quando comecei a estudar para o CACD, em 2003, achei que seria fácil obter pontos em economia (por ser mestre em economia pela USP). Mas quando fui olhar as questões, fiquei meio perdido: por exemplo, é comum, na prova, haver algumas citações de autores (geralmente economistas) ou de documentos importantes (ex: OMC, Banco Mundial, FMI etc) seguidas de uma instrução para comentar os temas objeto dessas citações.
Em alguns casos, eu simplesmente não sabia o que era pedido (sem querer culpar a Banca Examinadora…). É aqui que o CACD pega no contrapé os candidatos de pensamento mais matemático ou quadrado, como era o meu caso (depois de 16 anos de carreira, pude arredondar bastante essa característica).
Orientações Iniciais
Minha primeira orientação básica: inclua questões de provas passadas do CACD nos seus estudos. Leia manuais e livros de Economia, mas sempre – de modo simultâneo e desde o início – procure questões (testes e discursivas) sobre os temas que você estudou. Acredito que isso ajudará muito na sua preparação e também no seu estado psicológico na hora da prova (“treino é treino, jogo é jogo”: mas o único jeito de se preparar para o jogo é com o “treino” mesmo).
Treinar com questões significa responder com suas próprias palavras e ter ideia do tempo que você leva para respondê-las. Eu me lembro de ter usado todo o meu tempo de prova para quase todas as matérias do CACD.
Abaixo abordarei recomendações de bibliografia. Todas as referências estão disponíveis em formato eletrônico (ebooks no Kindle ou Itunes) para venda ou download. A vantagem, na minha opinião, é que facilitam as “buscas” para estudo. Isso também permite que o candidato folheie amostras grátis online das referências.
Bibliografia introdutória
Recomendo começar os estudos pelo Manual do Candidato da FUNAG (Renato Baumann e Samo S. Gonçalves, edição de 2016). É gratuito para download e resume todo o programa (vai até um pouco além do programa atual, que foi reduzido em 2018). Além disso, há questões para fixação de leitura, testes sobre História Econômica Brasileira, as melhores respostas do CACD de 2003 a 2014 (para discursivas), além dos guias mais recentes organizados pelos próprios aprovados no concurso.
O livro “Economia Brasileira Contemporânea” (Gremaud; Vasconcellos; Toneto Jr) constitui bom resumo do programa, embora menos voltado para o CACD, pois cobre conceitos básicos de Macroeconomia, Economia Internacional e História Econômica Brasileira.
Na mesma linha, recomendo o “Manual de Economia dos Professores da USP” (Pinho; Vasconcellos; orgs.), que também cobre Micro, Macro e Economia Internacional. Talvez usaria somente um deles (overlap de autores e conteúdo).
Para citar dois livros gringos, ficaria com “Introdução à Economia” (Paul Krugman e Robin Wells) e o de mesmo título do economista Gregory Mankiw. Ambos são bastante didáticos para Micro, Macro e Economia Internacional, com ligeira vantagem para o Krugman e Wells (pelos capítulos).
Microeconomia
Para o CACD, o melhor livro sobre Microeconomia na minha opinião é o “Microeconomia” (Paul Krugman e Robin Wells). Há uma versão amplamente disponível no Brasil, inclusive em português, de 2015. Os americanos são imbatíveis na didática da matéria e o Paul Krugman tem um talento especial para isso. O livro é recheado de exemplos e casos práticos (obviamente mais voltados para a realidade dos EUA).
Macroeconomia
O livro-texto básico mais utilizado no mundo é o “Macroeconomia” (Gregory Mankiw). É o melhor livro para macroeconomia entre os que indico aqui. Por outro lado, ele não cobrirá a parte de Economia Internacional toda, somente a de Economia Aberta (excelente abordagem do modelo IS-LM-BP, por exemplo).
Economia internacional
Novamente apelo para a didática ao recomendar “Economia Internacional – Teoria e Política” (Paul Krugman e Maurice Obstfeld). Minha ressalva “pragmática é que não necessariamente você precisará de um livro somente sobre este tema. Acredito que valha a pena como livro avançado sobre Economia Internacional, em relação ao que o candidato poderá estudar nas demais referências acima. É excelente para teorias do comércio, política comercial e economia aberta. Uma opção seria obter legalmente cópias de trechos de interesse em alguma biblioteca.
História Econômica Brasileira
O melhor livro na minha opinião é o “A Ordem do Progresso” (Marcelo de Paiva Abreu, organizador). A edição mais atualizada cobre o período de 1822 a 2010. É uma abordagem mais ortodoxa da História Econômica, com autores como Gustavo Franco, André Lara Resende, Winston Fritsch. Mas não é o livro mais fácil de se ler. Se você não tem familiaridade com Economia, dou outras opções: “Economia Brasileira” (José Márcio Rego e Rosa Maria Marques, orgs.) é bastante didático e relativamente conciso; “A Economia Brasileira” (Werner Baer) é mais amplo e atualizado, sem ser tão técnico quanto “A Ordem do Progresso”.
Considerações finais
Por qual das quatro partes da matéria o candidato deve começar? Em primeiro lugar, recorde-se que, estatisticamente, essas quatro partes têm-se materializado na prova com grau de probabilidade similar (uma questão para cada uma, talvez com uma ligeira vantagem para Macroeconomia, que em alguns anos teve mais de uma questão).
A verdade é que se trata de escolha bastante pessoal. Eu recomendaria começar por História Econômica Brasileira (até pela sinergia com História do Brasil no CACD). Em seguida, estudar Macroeconomia e Economia Internacional. Deixaria Microeconomia por último, por entender que poderia ser a parte mais técnica de todas em alguns aspectos (para não familiarizados). Por outro lado, haverá candidatos que estarão muito interessados em Micro e começarão por aí. Ou talvez estudarão Macro antes de História Econômica, ótima alternativa.
Outro ponto importante é tomar decisões estratégicas sobre a bibliografia. Se o candidato não tiver muito tempo para estudos, deverá ser pragmático. Veja por exemplo que não citei os clássicos aqui, como Formação Econômica do Brasil, de Celso Furtado. Inquestionável clássico cujo conteúdo é em parte analisado em todas as referências que recomendei acima sobre história econômica.
Foco na maximização dos resultados
O propósito do candidato deve ser maximizar o seu resultado no CACD. Se tiver tempo, sim, leia Celso Furtado, Caio Prado Júnior, Sérgio Buarque de Holanda, Gilberto Freyre e todos os outros clássicos pensadores do Brasil. Ocorre que, em boa parte dos casos, o candidato terá de escolher algumas poucas bibliografias (ainda mais levando em conta outras matérias). Foi assim comigo: estudei para o CACD enquanto terminava o mestrado, dava aulas na USP e, depois, trabalhava no então Ministério do Planejamento. E ainda havia provas orais de inglês e questões internacionais (tínhamos que treinar “apresentações” sobre temas que eram sorteados…). Era impossível estudar toda a bibliografia.
Levando em consideração a bibliografia que recomendei acima, por exemplo, cabe a você deve decidir se vai usar somente um livro introdutório (como o do Krugman) para Micro, Macro e Economia Internacional, sem se aprofundar em livros específicos dessas partes, ou se, ao contrário, não usará livros introdutórios, mas somente os específicos para cada macrotema.
Essas decisões são muito particulares e devem variar em função do seu grau de familiaridade com Economia e do tempo que dedicará para os estudos. Por isso, essas questões estratégicas merecem consideração bastante cuidadosa logo no começo de sua preparação. Defina um plano factível de estudos (sujeito a futuros ajustes, claro) e o execute com disciplina, buscando, sempre, progredir na capacidade de se expressar sobre os temas estudados por meio da prática habitual da escrita.
Hélio Silva Filho
Diplomata e Economista
Hélio Silva Filho é diplomata, professor e economista. Conselheiro da carreira, foi condecorado no grau de Comendador da Ordem do Rio Branco. É mestre em Economia pela Universidade de São Paulo (USP), onde também lecionou nos cursos de graduação em Economia e Administração. Foi professor assistente no curso de formação de diplomatas do Instituto Rio Branco (IRBr) e titular de cursos preparatórios para o Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata (CACD). Como diplomata, serviu na Delegação Permanente junto à Organização Mundial do Comércio, em Genebra e nas Embaixadas do Brasil no México e no Paraguai.
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